Toyota, ano 1

Como o momento em que a Toyota deverá passar a GM e tornar-se líder mundial em vendas e produção da indústria automobilística está se aproximando, diversos órgãos de imprensa têm se interessado pelo assunto nas últimas semanas. Há uma possível “nova manchete” no ar. Porém, trata-se de uma situação puramente simbólica, pois a Toyota é, de fato, a nº 1 em qualidade, produtividade e rentabilidade há pelo menos duas décadas. Ter volumes de vendas e produção maiores que as outras montadoras é conseqüência disto.

Tal ascensão ocorreu graças a seu sólido e consistente desempenho ao longo dos anos. Surgiu como uma minúscula empresa nos anos 30; em 1960, produziu aproximadamente 154.000 veículos, enquanto que a GM, então maior montadora do mundo, produziu cerca de 2,5 milhões. Em 2003, a Toyota superou a Ford e tornou-se a segunda maior montadora do mundo, com quase 7 milhões de unidades vendidas.

Ao prepararem suas “matérias especiais” para quando esse “momento mágico” chegar, alguns dos jornalistas responsáveis por tal pauta têm nos procurado. Ao ouvirem respostas sugerindo que o sucesso da Toyota vem da adoção de um modelo de negócios que procura incessantemente eliminar desperdícios sob a ótica dos clientes, através de análises minuciosas de todos os seus processos, considerando um conjunto de princípios, valores e práticas - cujo lado mais visível e conhecido é o Sistema Toyota de Produção - sentimos um certo desapontamento do outro lado da linha. Alguns até verbalizam: “mas isso eu já sei”, frustrando-se, talvez por esperarem alguma “novidade”.

Tal atitude é compreensível, pois vivemos em um mundo em que novas teorias de administração e ferramentas gerenciais surgem com velocidade crescente. Este comportamento de determinados jornalistas, mesmo os especializados, não parece ser diferente do de algumas lideranças do mundo dos negócios. O fato de o sucesso da Toyota advir de um conjunto de idéias e práticas desenvolvidas há muitos anos parece causar certa decepção naqueles que esperam soluções rápidas e imediatas para transformar os negócios.

Sabemos há muito que os princípios desenvolvidos e aplicados pela Toyota, que denominamos Sistema Lean, podem ser aplicados por qualquer empresa de qualquer setor e país. Também sabemos que, por parecer “entediante” para alguns e “trabalhoso” para outros - pois exige atenção a detalhes, foco no gemba (local onde as coisas acontecem), disciplina etc – o Sistema não atrai tanto a atenção de muito líderes empresarias, como seria de se esperar.

Outros, talvez pelo fato de terem experimentado algumas das ferramentas conhecidas há alguns anos, sentem-se confortáveis com os resultados alcançados e acham que não precisam fazer mais nada, incapazes de perceber que a possibilidade de aperfeiçoamentos é infinita. Ou seja, não foram capazes de transpor o universo das melhorias pontuais e da aplicação de ferramentas isoladas.

Entretanto, as vitórias contínuas da Toyota tendem a estimular um número cada vez maior de empresas a adotar esse Sistema. Mas, para funcionar, tais iniciativas precisam vir acompanhadas de novas atitudes. Se acreditarem que seguindo esta “nova moda” transformarão as empresas do dia para a noite, como se fosse a mais nova receita fácil e rápida, alguns líderes se frustrarão rapidamente.

Nossa experiência de mais de 7 anos acompanhando e apoiando diretamente empresas nessa jornada sugere que devemos alertar para as dificuldades a serem enfrentadas.

Para alguns, os conceitos e ferramentas lean parecem não constituir “novidade” alguma: leram alguns livros e artigos, ouviram falar ou implementaram alguma ferramenta. No fundo, é verdade. São idéias antigas e provadas com sucesso na prática. Todavia, o outro lado da moeda é que nenhuma empresa, nem mesmo do setor automotivo, que há anos segue esse caminho, conseguiu ter desempenho semelhante ao da Toyota. Portanto, o desafio é fazer certo e não apenas saber e conhecer.

Mesmo assim, o número de empresas que dizem “já somos lean” é cada vez maior. Entretanto, esta não é nossa opinião. Falta muito ainda para as empresas transformarem seus valores e conceitos gerenciais mais profundos. Esperamos que a ascensão da Toyota como a no 1 em vendas possa ser mais um efeito-demonstração positivo.

Muitas empresas gostariam de tornarem-se “as Toyota” de seus respectivos setores. Ótimo! É uma ambição que cremos ser possível de ser atingida e é exatamente para isso que existimos e trabalhamos. Mas alertamos: não será fácil. Isso vai exigir um conjunto de idéias, valores e práticas quase sempre completamente diferentes daqueles que a empresa possui. Mas valerá a pena, se fizermos da maneira certa.